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Cessar-fogo em Gaza: Uma pausa necessária, mas insuficiente

Uma pausa na violência que não resolve o cerne do problema: a ocupação, o cerco e a negação dos direitos fundamentais do povo palestino

Por Faysa Daoud



Bandeira Palestina - Reuters


O recente cessar-fogo entre Israel e Hamas, embora seja um alívio momentâneo, não é motivo de celebração. Para o povo palestino, que testemunhou um genocídio em plena luz do dia, essa pausa é uma lembrança dolorosa de uma tragédia que quase dizimou a nossa existência.


Em 15 meses de conflito, mais de 46 mil palestinos perderam suas vidas, grande parte civis – mulheres, crianças e idosos. O número não representa apenas vidas interrompidas, mas um trauma geracional, uma destruição sistemática da identidade e da dignidade de um povo.


Em Gaza, onde os bombardeios incessantes transformaram bairros inteiros em ruínas, as famílias lutam para encontrar os corpos de seus entes queridos sob escombros que antes chamavam de lar.


Enquanto o mundo vê neste cessar-fogo uma oportunidade para negociar, nós vemos uma pausa na violência que não resolve o cerne do problema: a ocupação, o cerco e a negação dos direitos fundamentais do povo palestino. 


Não há liberdade em Gaza. O controle de fronteiras, a restrição à entrada de bens básicos e a falta de acesso a serviços essenciais já haviam transformado a região em uma prisão a céu aberto antes mesmo do conflito mais recente.


O cessar-fogo traz promessas de mais ajuda humanitária e a libertação de reféns. Mas não podemos aceitar como solução a mera sobrevivência em condições sub-humanas. 


O mundo precisa reconhecer que não estamos apenas falando de um “conflito”, mas de décadas de opressão sistemática contra um povo que clama por autodeterminação.


O que Gaza precisa não é apenas de caminhões de alimentos e remédios – embora essenciais –, mas de um futuro onde possamos viver em paz, com dignidade, e reconstruir nossas vidas sem o medo constante de ataques ou desocupações forçadas.


É hora de a comunidade internacional agir de forma contundente. A neutralidade diante do genocídio é cumplicidade. Países que promovem discursos de direitos humanos não podem mais fechar os olhos para o que acontece em Gaza. 


É necessário que Israel seja responsabilizado por suas ações no Tribunal Penal Internacional. Precisamos de pressão política para o fim da ocupação e do bloqueio.


A paz só será possível quando houver justiça. Para cada criança palestina morta, para cada mãe que perdeu seus filhos, para cada idoso que viu sua terra ser tomada, não há cessar-fogo que apague as feridas deixadas por essa violência brutal.


Por isso, faço um apelo: que este cessar-fogo seja apenas o início de um compromisso real pela paz, que vá além das palavras e das conveniências políticas. 


Que o mundo olhe para Gaza não como um campo de guerra, mas como um lar de seres humanos que, apesar de quase dizimados, continuam a resistir e a sonhar com liberdade.


A luta do povo palestino não é apenas por sobrevivência. É por dignidade, por direitos e por um futuro que nunca nos foi permitido sonhar plenamente. Que a memória dos que perdemos nos inspire a exigir mais do que pausas; que exijamos uma verdadeira justiça.


Faysa Daoud - é presidente da ONG Refúgio Brasil, uma organização de caráter humanitário, localizada em Mogi das Cruzes - SP, que se ocupa de prestar assistência a refugiados da Síria, Iraque, Palestina e Egito, entre outros imigrantes.

Faysa é arabe palestina e mora no Brasil há mais de 40 anos. A sua história no país se identifica com a das pessoas que ela ajuda quando aqui chegam. A presidente da ONG também teve de sair da Palestina por conta de uma guerra, quando chegou no Brasil tinha 17 anos de idade

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